As linguagens do amor: muito além do comportamento, uma escuta do desejo

Nadiely Oliveira

5/23/20253 min read

person holding bouquet of flower
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As Linguagens do Amor: muito além do comportamento, uma escuta do desejo

Por Nadiely Oliveira, psicóloga e neuropsicóloga

Em tempos de relações líquidas, como diria Bauman, onde o amor muitas vezes é confundido com satisfação imediata, o livro As Cinco Linguagens do Amor, de Gary Chapman, tornou-se um best-seller ao propor um mapa de como expressar e receber amor. A proposta parece simples: cada pessoa possui uma ou mais formas preferenciais de se sentir amada, são elas: palavras de afirmação, tempo de qualidade, presentes, atos de serviço e toque físico.

No entanto, baseada na leitura deste livro, proponho aqui uma escuta diferente: e se essas linguagens forem mais do que modos de amar? E se forem sintomas do modo como fomos (ou não fomos) amados? E se, ao invés de apenas aprendermos a "falar" a linguagem do outro, começarmos também a escutar o que essa linguagem tenta curar?

Amor e linguagem: um território de desejo

A linguagem do amor, proposta por Chapman, é frequentemente tratada como um conjunto de ações que podem auxiliar em uma relação satisfatória. Mas considerando o amor um afeto que não se reduz ao fazer pelo/para o outro, mas também inclui o desejo do sujeito, compreendemos, na psicanálise, que este desejo é marcado pela falta.

Então, não existe um amor que preencha completamente o outro (e nem deve). Isso significa que, muitas vezes, aquilo que pedimos em forma de “linguagem” é um modo de tentar nomear uma ausência: o tempo de qualidade pode tentar cobrir a solidão infantil; os atos de serviço, uma tentativa de ser visto no cotidiano.

Como praticar o amor de forma mais consciente

Considerando essas “entrelinhas”, proponho a tentativa e possibilidade de praticar o amor de forma mais consciente, ao invés de apenas seguir um manual de instruções, sugiro movimentos que podem ajudar em uma escuta mais amorosa das linguagens no relacionamento:

1. Escute o que se repete e o que dói

Quando seu parceiro insiste em algo (“você nunca diz que me ama”, “você não me abraça”), não escute apenas como cobrança. Escute como sintoma. O que está tentando ser dito por trás disso? O que esse pedido tenta restaurar? A partir destes questionamentos, convide seu parceiro a contar quando começou a sentir falta disso. O que isso significava para ele esse gesto? Assim, a linguagem do amor deixa de ser só uma ação e passa a ser um campo de investigação do desejo.

2. Reconheça sua linguagem também como defesa

Você acredita que só se sente amada com palavras ou com presentes? Questione isso. De onde vem essa necessidade? É uma linguagem ou uma tentativa de manter uma ferida encoberta? Gosto da ideia de escrever sobre sentimentos, neste caso, pode ser um pequeno diário do amor. Quando você se sentiu verdadeiramente amado? Que gesto (ou ausência dele) marcou você? Reflita se essa linguagem está protegendo você do risco de amar sem garantias.

3. Não ame para evitar o conflito, ame para sustentar o encontro

O uso das linguagens do amor muitas vezes entra em cena como tentativa de evitar brigas. “Se eu fizer o que ele gosta, ele não vai reclamar.” Isso é amor? Ou é apenas uma gestão de danos? Pense que ao invés de oferecer o que o outro espera como óbvio, experimente perguntar: O que faço você sentir em relação a mim? Essa pergunta desloca o foco do ato isolado para a relação viva, em movimento, onde as linguagens podem ser reinventadas.

Amar é traduzir, mas também desconfiar das palavras

Chapman nos deu um importantíssimo vocabulário. Mas amar é mais do que repetir palavras/gestos num idioma conhecido, é traduzir constantemente, inclusive os silêncios. É aceitar que, muitas vezes, falaremos línguas diferentes, e que isso não precisa significar desamor, mas uma oportunidade de escuta.

Na clínica, vejo casais que se perdem tentando cumprir “protocolos afetivos” sem jamais se encontrarem de fato. Porque amar não é fazer somente o que o outro quer, mas também estar disponível para escutar o que ele nem sabe que precisa dizer.

E talvez, só talvez, essa seja a linguagem mais profunda do amor: a escuta do que ainda não tem nome. Não é tarefa fácil, mas é possível.

E se quiser continuar essa conversa, estou à disposição.

Atendimento clínico (online e presencial Natal/RN)

Referências:

BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.

CHAPMAN, Gary. As cinco linguagens do amor: como expressar um compromisso de amor a seu cônjuge. 3ed. São Paulo: Mundo Cristão, 2009.